Por Marla Lopes
Apesar dos artigos e publicações, em geral, abordarem a Diástase Abdominal apenas como um problema advindo da gravidez, o excesso de peso e os exercícios abdominais executados de forma incorreta podem contribuir para o aparecimento dessa alteração na parede abdominal, tanto em homens quanto em mulheres. Em consequência dessa deformidade na região abdominal, a integridade do “core” pode diminuir potencialmente e, ainda, criar estratégias ruins para postura, movimento e/ou respiração, e criar falhas que favoreçam o aparecimento de dor lombar e disfunções no assoalho pélvico.
Os músculos abdominais são foco de treinamento em vários esportes e o grande objetivo em técnicas que exigem precisão e controle. Ter o abdômen bonito permeia o imaginário, o desejo contido dos “malhadores”, e caracteriza, muitas vezes, o aspecto saudável de um corpo. Mas a importância do abdômen (e seus músculos) vai além do referencial estético. O abdômen, com sua estrutura de músculos e fáscias, forma uma espécie de cinturão responsável por manter os órgãos abdominais em seu lugar e proteger todo conteúdo da cavidade abdominal.
Estes tecidos são importantes, também, pois participam da respiração, ajudam na postura, nos movimentos do tronco, na estabilização da coluna e, ainda, contribuem para as funções que envolvem a tosse, espirro, evacuação e trabalho de parto (Lee et al, 2008; Sapsford, 2004).
Os músculos abdominais que formam esse apoio elástico são: o reto abdominal, os oblíquos (externo e interno) e o transverso. Quando os músculos abdominais se distendem exageradamente ou sucessivas vezes, as fibras sofrem esgarçamento. A área central, conhecida como linha alba, que fica entre os retos e é formada de tecido conjuntivo, é a que mais sofre. Esta frouxidão na linha alba deixa um espaço entre os músculos retos abdominais, condição conhecida como Diástase Abdominal ou Diástase dos Retos. É mais comum acontecer próximo do umbigo e pode ser medida com os dedos ou paquímetro ou, então, de forma mais confiável, via USom.
Nas mulheres, a diástase é causada pela gravidez, obesidade ou idade (em associação com flacidez abdominal). Na gravidez, o útero aumentado de tamanho estira o abdômen para dar espaço ao crescimento do bebê e pode favorecer essa separação das duas grandes bandas paralelas do reto abdominal.Algumas condições favorecem o aparecimento da diástase nas grávidas como: maior idade da mãe, flacidez prévia, ganho de peso aumentado (da mãe e/ou bebê), exercícios abdominais “agressivos” após o 1o trimestre, gestações múltiplas, cesariana, etc. Em geral, nas pequenas diástases, ocorre uma resolução após 6 semanas do parto (Boissonnault, 1998), mas se bem reabilitado, o abdômen pode garantir boa função, mesmo existindo uma separação maior(Lee et al, 2008).
Embora pouco abordada, a Diástase também pode ocorrer em homens ou por aumento de peso e/ou por grandes pressões dentro do abdômen.Quando há acúmulo de gordura na região abdominal associado com distensão progressiva, por exemplo, ocorre deformidade na parede abdominal que pode provocar diástase do reto e hérnias abdominais (Pitanguy et al, 1999). Seu aparecimento está muito associado, também, ao aumento da idade, às flutuações de peso, halterofilismo, abdominais completos executados erroneamente, fraqueza abdominal familiar e condições crônicas que induzam à grande pressãodentro do abdômen (Nahaset al, 2001; Lockwood, 1998).
Mas disso tudo, o que é preocupante para nós que trabalhamos com movimento, é que: exercícios (principalmente, abdominais ‘pesados” e carregamento de peso) executados de forma incorreta, podem aumentar exageradamente a pressão intra-abdominal, favorecendo o aparecimento da diástase dos retos e resultando, ocasionalmente, em hérnias medianas.Numa importante página da Fisioterapia atual, o estudioso dos Trilhos Anatômicos, Tom Myers, escreveu num dos seus artigos que adquiriu uma diástase em função do mau uso da técnica de Pilates: “I had a mild one myself a few years ago via bad Pilates teaching”. Triste realidade!
O que se sabe é que uma Diástase maior que 2,5cm pode interferir na capacidade da musculatura abdominal de estabilizar o tronco e em funções como postura, controle lombo-pélvico, defecação, parto, contenção vesical. Como existe uma relação sinérgica entre os músculos abdominais e o assoalho pélvico, a diminuição da função muscular do abdômen, associada à diástase, pode afetar a performance do assoalho e provocar disfunções como a incontinência urinária de stress, incontinência fecal ou prolapso pélvico e, ainda, dor lombar (Sapsford e Hodges, 2001; Neumann e Gil, 2002; Spitznagle, 2007).
A boa notícia é que exercícios realizados corretamente podem favorecer a prevenção ou diminuição da diástase abdominal (Mesquitaet al, 1999; Rett et al, 2009; Difiore, 2000). Os exercícios de estabilização da coluna, muito utilizados nos tratamentos da dor lombar, serão os mais indicados para esses casos. Fazer uma longa, firme e sutil contração do transverso do abdômen, associada à ativação do assoalho pélvico é a dica importante para execução de todos os exercícios. Preferir os abdominais que movimentam as pernas (sem protrusão do abdômen) aos abdominais com movimentos do tronco e sempre, adaptando os exercícios para reduzir o stress sobre a parede abdominal.
Quando a cirurgia está indicada? Quando existem danos significativos às estruturas e uma tensão suficiente já não pode ser gerada para garantir uma pressão abdominal ideal, nem garantir a execução das funções. Ou seja: nos casos de pós-parto, onde a mulher ainda apresenta dor lombo-pélvica e/ou incontinência, mesmo após um ano realizando tratamento para restaurar a função; nos casos em que a largura da linha média está excedida e os conteúdos abdominais são facilmente palpáveis através da abertura, o que pode causar desconforto; e nos casos gerais que o tratamento não foi capaz de resolver a dor lombar e ainda há pobre controle pélvico e disfunção do assoalho pélvico.
Assim, para prevenir ou tratar a Diástase dos Retos a melhor estratégia é estimular a ativação dos músculos profundos. Exercitar-se com cautela e boa orientação físico-nutricional pode ser suficiente para alcançar os estereótipos de beleza. A saúde não pode ser apenas um objetivo, ela tem que ser um modo de vida. Transforme sua vida, dia a dia! Mude hábitos! Evite os “exageros”, respeitando seus limites! E bons treinos!
Referências Bibliográficas:
Blanchard, PD. Diastasis recti abdominis in HIV-infected men with lipodystrophy. HIV Med. 005. 6: pp. 54-56
Boissonnault JS, Blaschak MJ. Incidence of diastasis recti abdominis during the childbearing year. Phys Ther. 1988. 68: p. 1082-1086
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Chiarello CM, Falzone LA, McCaslin KE, Patel MN, Ulery KR. The effects of an exercise program on diastasis recti abdominis in pregnant women. Journal of Women’s Health Physical Therapy. 2005. 29: pp. 11-16.
Difiore J. O guia completo para a: Boa forma física pós natal. São Paulo: Manole, 2000.
Lee DG, Lee LJ, McLaughlin L. Stability, continence and breathing: The role of fascia following pregnancy and delivery. Journal of bodywork and movement Therapies. 2008 – Elsevier.
Lockwood T. Rectus muscle diastasis in males: primary indication for endoscopically assisted abdominoplasty. Plast Reconstr Surg. 1998. 101: pp. 1685-16891
Mesquita LA, Machado AV, Andrade AV. Fisioterapia para Redução da Diástase dos Músculos Retos Abdominais no Pós-Parto. RBOG 1999; 21(5):267-272.
Nahas FX, Augusto SM, Ghelfond C. Nylon versus polydioxanone in the correction of rectus diastasis. Plast Reconstr Surg. 2001.107: pp. 700-706
Neumann P, Gill V. Pelvic floor and abdominal muscle interaction: EMG activity and intra-abdominal pressure. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2002. 13: p. 125-132
Pitanguy I, Jaimovich CA, Mazzarone F, Parra JFN. Semiologia da Parede Abdominal: seu valor no Planejamento das Abdominoplastias. Rev.Soe. Bras. CiroPlást. 1999. v.l4 n.3 p. 21-50.
Rett MT, Braga MD, Bernardes NO, Andrade SC. Prevalence of diastasis of the rectus abdominis muscles immediately postpartum: comparison between primiparae and multiparae. Ver Bras Fisioter. 2009; 13(4): 275-80.
Sapsford RR, Hodges PW, Richardson CA, Cooper DH, Markwell SJ, Jull GA. Co-activation of the abdominal and pelvic floor muscles during voluntary exercises. Neurourol Urodyn. 2001. 20: pp. 31-42
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